Quando as carcaças de cinco tubarões brancos (Carcharodon carcharias) apareceram em uma praia na África do Sul, os corpos dos animais pareciam praticamente intactos. Mas havia algo estranho: eles estavam sem o fígado.
As marcas de dente no corpo das vítimas denunciaram quem estava por trás do massacre: as orcas (Orcinus orca), uma das poucas espécies que caçam tubarões.
As carcaças foram encontradas no ano passado, em Gansbaai, no sul do país. E, desde então, os cientistas têm tentado decifrar o mistério da ausência de fígado nos animais, e como os órgãos foram extraídos com precisão tão assustadora.
A BBC conversou com a bióloga marinha Alison Towner, da fundação sul-africana Dyer Island Conservation Trust, uma das pesquisadoras que analisou os restos mortais dos tubarões brancos.
Afinal, o que levou as orcas a removerem apenas o fígado de suas presas?
"Estamos falando de animais enormes", afirmou Towner à BBC.
"O primeiro tubarão branco em que fizemos necropsia tinha cinco metros de comprimento e pesava 1,1 tonelada."
"Ao ver os tubarões, não suspeitamos, a princípio, que faltava um órgão. Mas quando viramos os animais, observamos que havia uma grande ferida sob as nadadeiras peitorais. E à medida que continuamos nossa análise, vimos que não tinham fígado", contou a especialista.
Quando as carcaças foram encontradas, a fundação Dyer Island publicou em suas redes sociais que a remoção do fígado tinha sido feita com "precisão quase cirúrgica".
"O fígado de um tubarão branco pode pesar cerca de 90 quilos, é um órgão enorme, mas as orcas o extraíram com grande precisão", completa.
"Como conseguem tirar o fígado? Essa é a pergunta de um milhão de dólares, porque, até hoje, não vimos nem filmamos orcas fazendo isso", afirmou Towner.
A bióloga acredita que as orcas trabalham estrategicamente em equipe, imobilizando primeiramente a vítima por meio de uma emboscada.
"Imaginamos que uma orca abocanhe em seguida uma das barbatanas peitorais, e uma segunda orca faz o mesmo com a outra. As barbatanas são como asas de um avião para os tubarões".
"Na sequência, as orcas nadam em direções opostas até que rasgam o tubarão, abrindo uma cavidade", explica a bióloga.
"Também sabemos que as orcas têm grande destreza com os lábios, diferentemente de outras espécies. Isso pode ser claramente observado em parques de shows de animais aquáticos, como o Seaworld, onde as orcas recolhem objetos com a boca."
Um elemento chave no ataque orquestrado é o trabalho em equipe que caracteriza as orcas.
"Uma orca pode medir até nove metros e pesar cerca de nove toneladas. Um tubarão branco, em comparação, pode medir até 6,4 metros e pesar até duas toneladas", pontuou Towner.
A grande vantagem das orcas na hora do ataque não é, no entanto, o tamanho, mas a estratégia de ação coordenada.
"Os tubarões brancos, diferentemente das orcas, são geralmente animais solitários. Só se juntam de vez em quando em volta de suas presas ao longo das faixas costeiras. É por isso que não têm o valor agregado das orcas de trabalhar em grupo".
E esse espírito de equipe é tão forte, que é provável, segundo Towner, que também compartilhem o fígado extraído de suas presas.
Ainda não está claro por que as orcas descartam as carcaças dos tubarões, apesar de precisarem consumir o equivalente a quase 3% de seu peso todos os dias para sobreviver.
Mas faz sentido que consumam o fígado dos animais.
Este órgão contém uma grande quantidade de esqualeno, composto natural que fornece energia e nutrientes em abundância.
Além disso, os fígados dos tubarões são ricos em lipídios e são um verdadeiro depósito de energia, que contém vitamina C, B12, A, ferro, niacina, sódio e carboidratos, entre outros nutrientes.
Ainda não se sabe muito a respeito da preferência das orcas pelo fígado de suas presas, mas os tubarões brancos também têm sua estratégia.
Enquanto as orcas estavam na costa da África do Sul, diminuiu o número de tubarões brancos na região. Mas assim que elas se mudaram para outro local em busca de presas, os tubarões brancos começaram a voltar.
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